A Crise da Saúde em Portugal: Uma Tempestade Perfeita?
Nos últimos anos, Portugal tem conhecido uma crise de saúde sem precedentes. A combinação de uma pandemia global, uma escassez crónica de profissionais de saúde e cortes nas despesas públicas tem colocado em cheque a capacidade do Sistema Nacional de Saúde (SNS) de responder às necessidades da população. Com dados alarmantes que emergem a cada dia, surge a pergunta: estamos a viver uma tempestade perfeita no setor da saúde portuguesa?
O cenário atual
Desde 2020, a pandemia de Covid-19 desafiou todos os sistemas de saúde do mundo, e Portugal não foi exceção. Segundo dados da Direção-Geral da Saúde (DGS), o SNS lidou com mais de 6 milhões de casos positivos e cerca de 30 mil mortes atribuídas ao novo coronavírus. Embora o país tenha obtido um sucesso considerável na vacinação — com cerca de 90% da população completamente vacinada até dezembro de 2022 —, os efeitos colaterais desta crise se manifestaram em múltiplas frentes.
Em 2021, o número de cirurgias não urgentes ficou atrasado em mais de 700 mil procedimentos, segundo o relatório do SNS. As listas de espera tornaram-se um pesadelo para muitos utentes, alcançando tempos de espera que vão de meses a anos para consultas e tratamentos necessários. Para além disso, o burnout dos profissionais de saúde, exacerbado pela pressão insustentável e pela escassez de recursos, fez com que muitos optassem por deixar a profissão ou emigrar. O resultado? Um SNS com cada vez menos médicos e enfermeiros, e um atendimento que já era deficitário a tornar-se insustentável.
Os números não mentem
A escassez de profissionais de saúde em Portugal é uma realidade evidente. Em 2023, o país tinha apenas 3,6 médicos por 1.000 habitantes, significativamente abaixo da média da União Europeia, que se situa em 4,1. Este dado revela a fragilidade do SNS, que enfrenta uma crescente falta de pessoal médico nas urgências e cuidados primários. Ao mesmo tempo, as condições de trabalho, a falta de incentivos e a acumulação de funções criam um ambiente tóxico que afasta novos profissionais da carreira.
Enquanto isso, o orçamento de saúde continua a ser um tema político delicado. Os cortes em investimento são frequentemente justificados por uma necessidade de contenção financeira, mas os especialistas alertam que esta abordagem está a comprometer o futuro da saúde pública no país. Em 2022, o SNS recebeu cerca de 13% do orçamento total do Estado, enquanto os custos com saúde mental e serviços sociais começaram a superar os orçamentos previstos. A situação é ainda mais complexa se considerarmos o envelhecimento populacional: em 2022, mais de 22% da população portuguesa tinha mais de 65 anos. Esta fatia crescente da população exige cuidados médicos mais intensivos e frequentes, colocando uma pressão adicional sobre um sistema já saturado.
O que dizem os cidadãos?
A insatisfação popular é palpável. Em várias sondagens realizadas ao longo do último ano, a saúde aparece consistentemente entre os principais temas de preocupação dos portugueses, com 70% dos inquiridos a considerarem que o SNS está em crise. As manifestações têm-se tornado comuns, com cidadãos e sindicatos a exigir melhorias urgentes nas condições de trabalho dos profissionais de saúde, assim como um aumento dos orçamentos destinados a esta área.
Conclusão
A crise da saúde em Portugal é, sem dúvida, uma questão complexa que exige uma resposta de várias frentes. O SNS, que sempre foi um orgulho nacional, enfrenta agora uma luta pela sobrevivência. Para se evitar uma catástrofe real, é crucial que o governo reveja as suas prioridades orçamentais e ouça as vozes dos profissionais e utentes. A saúde dos portugueses deve ser colocada em primeiro lugar, não apenas como um slogan, mas como uma realidade a ser defendida. Neste momento crítico, não podemos permitir que as vidas dos cidadãos sejam relegadas para segundo plano. É tempo de agir, antes que a tempestade venha para ficar.