Em um mundo cada vez mais polarizado, onde as desigualdades sociais e económicas se acentuam, a justiça torna-se um tema central do debate público. Portugal, um país que tem vindo a recuperar-se das feridas da crise financeira de 2008, enfrenta agora novos desafios no que respeita à sua justiça. A questão que se coloca é: está o sistema judiciário português a conseguir equilibrar a eficiência e a equidade?
A Indíciécia da Justiça
Recentes relatórios do Conselho Superior da Magistratura (CSM) revelam que o tempo médio de espera para um julgamento em algumas áreas do Direito pode ultrapassar os 500 dias. Esta realidade é alarmante, especialmente quando consideramos que a morosidade processual pode afetar diretamente a vida dos cidadãos. Casos envolvendo guarda de filhos, famílias em conflito e até crimes violentos, podem arrastar-se durante anos, criando um clima de insegurança e injustiça.
Não é de espantar que, segundo uma sondagem da Eurobarómetro, 65% dos portugueses acreditem que o sistema judiciário é lento, e 59% consideram que a justiça não é imparcial. Uma situação que, se não for abordada com seriedade, pode minar a confiança dos cidadãos no Estado e nas instituições públicas.
Fiscalização e Impunidade
Outro ponto crítico que não pode ser ignorado é a dificuldade em responsabilizar indivíduos poderosos, muitas vezes ligados a corrupção, fraudes e outros crimes financeiros. O caso do "Luís Filipe Vieira" é emblemático. Acusado de crimes financeiros, a sua detenção levantou uma onda de perguntas sobre o real compromisso do sistema judiciário em lidar com a corrupção. Afinal, ações eficazes contra figuras proeminentes são fundamentais para que os cidadãos sintam que a justiça é verdadeiramente cega e acessível a todos, sem distinção.
O Acesso à Justiça: Um Luxo?
Um estudo da Comissão Europeia para a Eficiência da Justiça (CEPEJ) revela que cerca de 20% da população portuguesa não tem acesso adequado à justiça. Os custos associados a processos judiciais, incluindo honorários de advogados e taxas de justiça, tornam o acesso a um advogado uma realidade distante para a maioria dos cidadãos. Ao mesmo tempo, os serviços de apoio jurídico têm dificuldade em lidar com a demanda crescente, sublinhando a desassistência crónica em que se encontra o sistema.
A desigualdade no acesso à justiça não afecta apenas os mais desfavorecidos, mas também compromete a saúde social do país. Uma sociedade onde apenas os que podem pagar têm acesso ao sistema é, na essência, uma sociedade que perpetua e exacerba as desigualdades.
A Solução? Inovação e Reforma
A reforma do sistema judiciário é, portanto, uma prioridade urgente em Portugal. O investimento em tecnologias, como a digitalização de processos judiciais, pode trazer ganhos significativos em eficiência. A criação de mecanismos de mediação e arbitragem, como alternativas ao processo judicial tradicional, deve ser explorada como forma de aliviar a carga nos tribunais.
Além disso, a formação contínua de juízes e advogados, focada em questões de equidade e direitos fundamentais, pode contribuir para um sistema mais justo e acessível. A promoção de uma cultura de responsabilidade e transparência dentro do próprio sistema também é essencial para restaurar a confiança da população na justiça.
O Que Está em Jogo?
O futuro da justiça em Portugal está em jogo. O equilíbrio entre eficiência e equidade não é apenas uma questão política, mas uma questão de princípios que afectam diretamente a vida dos cidadãos. A urgência das reformas propostas não deve ser subestimada. Se o sistema judiciário falhar em atender às necessidades da sociedade, corremos o risco de criar uma geração que não acredita nas instituições democráticas e na capacidade do Estado em garantir a justiça.
Os desafios são grandes, mas a oportunidade de construir um sistema judicial mais eficaz e justo está à nossa frente. Resta saber: num país que anseia por mudança, conseguiremos finalmente dar a cada português o que por direito lhe pertence: acesso à justiça? A resposta, mais do que nunca, parece estar nas mãos de todos nós.